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Crise dos EUA.



18/08/2011 - 03h30

"É a primeira crise que nasceu na periferia", diz Francisco de Oliveira
CLAUDIA ANTUNES
DO RIO


A crise econômica nos EUA e na Europa foi provocada pela "revolução" que China e Índia imprimiram ao capitalismo, provocando uma mudança na estrutura do poder econômico "sem paralelo na história", afirma o sociólogo Francisco de Oliveira, professor emérito da USP. "É a primeira crise que nasceu na periferia."
Segundo ele, não há muito o que o governo brasileiro possa fazer para conter seus efeitos perigosos, como a valorização da moeda nacional. "É como colocar água em cesto", afirma o acadêmico marxista que foi um dos fundadores do PT, do qual se afastou no início do governo Lula.

FOLHA - Como o sr. analisa o estágio atual da crise econômica nos EUA e na Europa?

FRANCISCO DE OLIVEIRA - Esta crise é a primeira que não nasceu no centro, nasceu na periferia. Daí a dificuldade de tratá-la. Ela nasceu da revolução que a China e a Índia imprimiram ao capitalismo. Esses países colocaram no mercado uma força de trabalho que o Ocidente em toda a sua história não conseguiu botar. É uma revolução extraordinária. Como no filme "Melancolia" [de Lars von Trier], é como se viesse outro planeta e explodisse a Terra.

Essa mão de obra começou a competir com a do centro?
Compete, e tente você produzir tecidos no Brasil. Não consegue.

Muitos economistas dizem que a bolha de crédito que explodiu em 2008 veio da estagnação da renda dos trabalhadores. O crédito foi para que continuassem a consumir.

O crédito dado por quem? Pela China. A China empurra trilhões na economia americana. O Fed (banco central) tem que emprestar aquilo. Passa para o sistema bancário americano, o sistema bancário foi reduzindo as taxas de juros, e sucateando o crédito. Como a renda de fato não cresce, na verdade caiu na última década, você tem um problema clássico de realização de valor [quando o baixo consumo reduz o lucro obtido com a produção]. Estão jogando dinheiro nos EUA porque do contrário liquida tudo, mas a origem da crise é asiática, não é americana.

Então não tem solução para ela?
Não tem, mas vão continuar jogando dinheiro, apagando fogo com gasolina.

Há um debate sobre se a crise assinala a decadência dos EUA como centro capitalista. Qual a sua opinião?
Não assinala a decadência como centro, mas é uma enorme novidade histórica. A China não tem nenhum interesse em torrar os EUA. Eles têm o dinheirinho deles lá. Quem são os maiores aplicadores em bônus do Tesouro americano? Primeiro a China, com um volume extraordinário [US$ 2 trilhões], depois a Índia e depois o Brasil.
Os chineses não têm interesse em entrar em uma guerra comercial ou financeira com os EUA. Se os EUA entrarem em colapso, vai todo mundo. A solução financeira é para não deixar quebrar, mas a raiz dela é uma mudança na estrutura do poder econômico mundial que é sem paralelo na história.

Essa mudança ainda não tem correspondente em outras formas de poder?
Nem no poder político nem no militar. A China é um anão militar, embora esteja acelerando. E também não tem poder político. A época do expansionismo chinês, que deu origem ao PC do B no Brasil, por exemplo, acabou.

Mas a China acabou com os antigos paradigmas, não?
Eles contribuem para quebrar paradigmas, mas não têm um novo modelo. Vai haver, mas o desenho ainda está se formatando. Os chineses têm um relevo extraordinário aí, mas ninguém sabe o que é.

E como o Brasil fica nessa situação?
Não vai acontecer nada demais. Vão ser períodos mornos, dependendo desse arranjo que está se formatando.

O sr. não prevê um bang, uma explosão?
Não, se tiver é uma surpresa extraordinária. É uma coisa que vai ter surtos de crescimento, depois retrai, modera. O dramático é que o governo brasileiro fica quase sem ter o que fazer.

As últimas medidas contra a valorização do câmbio são um placebo?
Placebo. Apesar do esforço da Dilma, não tem o que fazer na economia. Qualquer esforço aí é jogar água em cesto.

Não tem meios de frear essa enxurrada de dólares?
Não. O Brasil fica se vangloriando de ter US$ 300 bilhões em reservas. Isso é uma bobagem. Num dia os EUA derretem isso. É briga de cachorro grande. Nós já passamos do nível de basset, agora somos um perdigueiro, por aí. Não chegamos a doberman não.

Fonte: Folha Online


Comentários

  1. um amigo em contou mas vc não precisa acreditar:
    ja são cinco os paises com ativos de fundos de pensão > que 100% do pib. o brasil esta em 17% e a iniciativa privada sustenta o placebo da insustentabilidade da previdencia publica com o objeto de manter o controle desta ferramenta (finanças globais) - de controle corporativo e governamental - e brevemente chegará a 40% do pib, num esforço de colocar para escanteio o dot gov.
    briga de cachorro grande.
    excesso de capital. isso não existia a 50 anos atras. nem nesta configuração. por isso saimos do padrão ouro, do padrão fé (em god nós confiamos - ta lá na nota - mas o mundo não é cristão) e do padrão petróleo (by us), motivo de ignorarem todo esforço ambiental multilateral a exemplo de kioto, sobre o mantra de não serem enquadrados por ninguém.
    se os paises (as maiores economias) de origem não conseguem remunerar seus fundos de pensão, ou os de alta renda não sabem lidar com o excesso de capital (islandia) no minimo, o brasil deve alinhar o discurso em torno do esforço de se tornar (ja o é mas a fazenda não quer assumir a responsabilidade) um hub financeiro para alocar investimentos local e globalmente a fim de prover meios de remuneração a este, trasncedendo a visão e limitação (tamanho) da economia, o que tem provocado a briga e falta de sono no ministro da fazenda que age e pensa local e com isso bolar fórmulas de impedir a entrada de capitais, ja que a perspectiva de investimentos produtivos local e além fronteira demanda um olhar e ação colaborativa multidiciplinar (multi-ministerial), mas, como (equivocadamente) a mídia elegeu os economistas e a fazenda como centro nervoso, quando não o é. temos uma inércia a ser vencida. força do hábito.
    a montadora da apple vai inverter a relação robo empregado, hoje em 0,01 para 100 em menos de cinco anos. acabou a festa da mão de obra barata no mundo. novo viés. não era compativel com o excesso de capital.
    a china piscou e a fabrica da apple iniciou obras no brasil porque uma renda percapita ling ling (US$2k) x brazuca (US$10k), somado a demanda crescente por energia renovável - não necessáriamente limpa - insumos, robos e....mercado consumidor no brasil, é o nome do jogo.
    o hub financeiro brazuca esta mirado para a africa (vide 12º econtro internacional de energia) ja que o brasil, juntamente com o continente africano, são as ultimas fronteiras agrícolas e de desenvolvimento sustentável deste século.
    bolsa familia global à vista. os R$50 bi da versão local, antes, passa pela bancarização e os multiplos de basel, logo, um doze avos do investimento vaia para as familias 11 doze avos para a criação de infra-estrutura para a atual, e, para a nova demanda consumidora chegar. o pensamento classico, mas, se não temos infra-estrutura, não é por falta de capital. temos um desafio politico. um desafio sistêmico.
    o proer e bolsa familia começaram por aqui. o primeiro já foi replicado nos us by inside job. (primeiro jogaram a culpa na periferia interna - sub-prime. não colou. agora tentam transferir para a periferia fora da caixa usando super-bond.)
    a periferia ja existia e jogava golf antes do primeiro imigrante de olhos azuis chegar nos us, por isso o bolsa familia global começa pela africa.

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