Diretor-presidente de empresa 'sem dono' chega a receber o dobro de seus pares em corporações com controlador definido
16 de julho de 2012 | 3h 07
MARIANA DURÃO / RIO - O Estado de S.Paulo
O crescimento do mercado de capitais brasileiro na última década e o decorrente aumento da dispersão acionária nas companhias trouxe um novo desafio para o investidor : monitorar a remuneração dos administradores de companhias abertas. Um diretor presidente de empresas 'sem dono' chega a receber o dobro de seus pares em corporações com um controlador definido.
Os benefícios aos acionistas das "empresas públicas", como são classificadas as companhias com grande pulverização societária, são conhecidos e exaltados pelo mercado. O principal deles é brindar os investidores com papéis mais líquidos.
Dados de um estudo recém-concluído expuseram o lado negativo da moeda: companhias em que não há um controlador ou grupo majoritário - com mais de 50% das ações com direito a voto - pagam, em média, 89% a mais à sua diretoria executiva e 82% aos membros do conselho de administração.
O levantamento foi feito pelo professor Ricardo Leal, do Instituto Coppead de Administração, e pelo advogado Marcos Pinto, sócio da Gávea Investimentos e ex-diretor da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
Com base em uma amostra de 315 companhias com ações negociadas em bolsa, eles analisaram a relação entre a composição acionária e a remuneração de executivos, informada detalhadamente por exigência da CVM, a partir de 2010.
Para Leal, da Coppead, o estudo é um alerta no momento em que o mercado brasileiro começa a conviver mais intensamente com empresas de estrutura acionária dispersa. Nos Estados Unidos, a falta de controle sobre os pacotes de remuneração gerou casos emblemáticos de manobras contábeis vinculadas aos ganhos de executivos, como na WorldCom e na Enron.
"Não há razão para acreditar que o que ocorreu nos EUA não pode se repetir aqui, onde o modelo de dispersão é novo. Os acionistas brasileiros, inclusive institucionais, ainda não são suficientemente engajados", diz Leal.
O estudo destaca que a estrutura de propriedade das companhias brasileiras ainda é bastante concentrada: apenas 49 das empresas analisadas têm controle minoritário. Ainda assim, foi possível detectar que as diretorias de empresas com esse tipo de controle têm uma remuneração 89% superior às demais. O principal diretor dessas companhias recebe, na média, mais que o dobro (104%) em uma empresa com controle majoritário.
Já no caso dos conselhos de administração ficou constatado que o total pago aos conselheiros supera em 82% o das demais. Outra conclusão que se destaca é que nas corporações que têm acionistas relevantes ou familiares no conselho a remuneração também sobe. Em média, a alta é de 16% para cada acionista dessas categorias. O aumento chega a 75% por conselheiro.
Para os autores do estudo - que propositalmente omite os nomes dos executivos pesquisados e das respectivas empresas -, essa diferença é relevante, mas menos significativa do que aquelas decorrentes da dispersão acionária. Isso porque a média do número de acionistas relevantes e familiares no conselho é relativamente baixa: 1,48 por companhia.
Além disso, eles frisam que a remuneração total dos conselheiros no Brasil é significativamente mais baixa que a de diretores: enquanto um diretor recebia em média R$1 milhão por ano (R$ 83 mil por mês) em 2009, um conselheiro recebia cerca de R$178 mil (R$ 15 mil mensais).
Individualmente, o maior valor pago a um membro da diretoria foi de R$ 29,8 milhões (na média, foi de R$ 1,5 milhão) naquele ano. Para os conselheiros a média foi bem inferior: R$ 178 mil (R$ 15 mil/mês) e teto de R$ 2,8 milhões.
A análise apontou que um aumento de 1% na participação acionária total (votante) do maior acionista da empresa corresponde a uma redução de 0,92% do total pago aos diretores. Se a conta incluir os cinco maiores acionistas, a queda chega a 1,23% na remuneração total do conselho e quase 2% para o conjunto da diretoria. No caso do diretor-presidente, o recuo é de mais de 2% nesta hipótese.
Para Leal, os dados derrubam o mito de que a maior dispersão só traz benesses, como liberar os minoritários de eventuais arbitrariedades por parte do controlador. O professor elenca ônus e bônus em todos os modelos de composição acionária.
Um dos efeitos colaterais da falta do controlador é justamente o de potencializar prejuízos nascidos de um comportamento oportunista de executivos, já que a fiscalização por vários pequenos donos da empresa é mais complexa.
Fonte: Jornal Estadão.
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